sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Capítulo 9 
A partir dessa noite a vida de Jacira mudou radical­mente. Durante o dia trabalhava na oficina com Marga­rida, nos fins de semana ia para a casa dela costurar, e, dia sim, dia não, encontrava-se com Nelson, às vezes indo ao cinema, outras dando algumas voltas pelas re­dondezas e sentando-se na praça para conversar.

Fazia dois meses que ela não ia às aulas de Er­nesto Vilares, por causa do trabalho na casa de Mar­garida. Sentia falta daqueles encontros agradáveis, das coisas que aprendia todas às vezes que ia lá. Mas a cada dia mais freguesas apareciam e elas, entusias­madas, aceitavam mais encargos.

Em um sábado, quando Jacira chegou na casa da amiga para trabalhar, ela disse-lhe contente:

- Estou pensando em deixar a oficina. A cada dia estamos tendo mais encomendas. Continuando na ofi­cina, estamos deixando de ganhar muito mais. Se eu trabalhar aqui o dia inteiro, será mais lucrativo, sem falar do prazer que sinto em ter novamente um ne­gócio próprio. Não quer fazer o mesmo?

Jacira assustou-se:

-  Deixar o emprego?

-  Nós duas iremos longe. Você me ajuda nas contas e na costura como até agora.

Jacira ficou pensativa. Nada iria lhe dar mais prazer do que deixar aquela oficina. Mas se o fizesse, ganharia o suficiente para sustentar a família?

-  Você acha que seria vantagem?

-  Penso que sim. Mas você, que é boa nas contas, vai calcular tudo e saberemos.

Jacira sentou-se com o caderno onde desde o início anotava cada roupa confeccionada, as despesas e o tempo gasto e começou a calcular o quanto ganharam naqueles meses. Como o dinheiro entrava picado, Mar­garida dava-lhe uma parte do lucro. Como era um di­nheiro extra, com ele Jacira comprara coisas pessoais.
Somando o quanto tinha recebido nesse período, surpreendeu-se. Mesmo trabalhando apenas nos fins de semana, elas tinham tirado mais do que recebiam na oficina. Quanto ganhariam trabalhando todos os dias?

Jacira pensou durante alguns minutos, depois decidiu:


-   Hoje no fim da tarde vamos juntas até a casa do dr. Ernesto. É uma pessoa em quem eu confio muito. Antes de tomar essa decisão, vamos ouvir o que ele tem a nos dizer.


-   Não podemos atrasar o serviço. Temos o ves­tido da d. Alice para entregar daqui a três dias.

- Não faz mal. Eu fico até mais tarde.

- Está bem. Eu também gostaria de conhecer esse seu amigo famoso.

Elas deixaram Marinho com uma vizinha e saíram. Alguns minutos antes das dezessete horas, entraram na casa de Ernesto, exatamente quando as pessoas estavam saindo da sala de cursos.

Algumas pararam para cumprimentar Jacira e Margarida adorou ser apresentada àquelas pessoas simpáticas e alegres. Ernesto estava conversando com alguns alunos e Jacira esperou que ele terminasse e viesse ao seu encontro:

-   Como vai, Jacira? Sentimos sua falta, hoje eu pensei muito em você.

-   Eu também senti falta das aulas. Esta é minha amiga Margarida.

Ernesto estendeu a mão sorrindo:

- Como vai? Jacira fala muito em você.

-   E no senhor também. Suas aulas muito a têm ajudado.

-   Nós estamos aqui porque precisamos tomar uma decisão importante e gostaríamos de ouvir a sua opinião - tornou Jacira.

- Nesse caso, vamos tomar um café e conversar. Elas, satisfeitas, acompanharam-no e depois de
ele explicar para Margarida em breves palavras seus objetivos naquele espaço, finalizou:

- Agora, podem falar. No que lhes posso ser útil? Jacira falou dos seus projetos, de como o volume
de trabalho estava crescendo, e finalizou:

- Nós pensamos que está na hora de deixarmos o emprego na oficina e nos dedicarmos exclusivamente ao nosso negócio.

Margarida interveio:

-  Devo esclarecer que eu já tive um ateliê antes, mas fracassei porque não sou boa nas contas. Freguesas nunca faltaram, mas eu não avaliava bem o trabalho, tinha vergonha de cobrar e fazia tudo barato.

-  Se você pretende abrir novamente seu negócio, o primeiro passo é valorizar seu trabalho. Quando você não valoriza adequadamente o que faz, acaba cortando seu sucesso. Para progredir terá de colocar um preço justo, onde você possa ter dinheiro sufi­ciente para manter uma vida confortável, com tudo o que tem direito.

As duas olharam admiradas, e Margarida argu­mentou:

- Eu sinto que fracassei por não saber lidar com dinheiro. Meu pai, quando eu era criança, dizia que o dinheiro é perigoso porque abre a porta de todas as tentações. Eu tinha medo de que as clientes me jul­gassem uma 
mercenária. Queria provar que eu era uma boa pessoa e não ligava para dinheiro.


-  O dinheiro não é culpado pelo mau uso que alguns fazem dele. 

Quando bem utilizado pode proporcionar coisas muito boas. É o caso das grandes fortunas que se interessam em contribuir para a melhora da sociedade, auxiliando nas pesquisas que aliviam o sofrimento hu­mano, dando oportunidade de emprego para as pessoas, possibilitando as grandes conquistas de progresso.

-  Olhando dessa forma... - tornou Margarida ad­mirada.

-  A vida nos dá tudo o que precisamos para des­frutar uma existência útil, rica e feliz. Saúde, inteli­gência, oportunidades para nosso desenvolvimento em todas as áreas, mas os resultados dependem do uso que fazemos, e serão bons se escolhermos o melhor.

- Eu queria melhorar, fiz o meu melhor, mas ainda assim não tive sorte.

-  Você fez o que pensou ser o melhor. Mas en­ganou-se na avaliação. É comum acontecer isso. Mas não é uma questão de sorte.

-  Como não? - questionou Margarida. - Sou uma pessoa honesta, trabalhadora, não exploro ninguém, tenho certeza de que sou boa profissional. As pessoas gostam do meu trabalho. O que me falta?

Ernesto sorriu, pensou um pouco, e respondeu:

- Você tem tudo para conseguir sucesso pro­fissional. O que lhe falta é apenas conhecer como a vida funciona.

- Como assim?

- A maneira como vemos as coisas, nossa forma de pensar, é que determinam nossas atitudes e elas é que movem os fatos em nossa vida.

Margarida meneou a cabeça negativamente fran­zindo o cenho e considerou:

- Não estou entendendo.

- É simples - respondeu Ernesto. - Para que as coisas aconteçam do jeito que você quer, terá de aprender como lidar com as energias de maneira adequada. Você não vai conseguir ter sucesso em seus negócios tendo vergonha de cobrar pelo seu trabalho. Você está oferecendo um trabalho bom, que custou seu esforço e merece obter alguma coisa em troca. Isso não quer dizer que você esteja sendo mercenária. A troca é muito justa.

-   É verdade, Margarida - interveio Jacira. - As pessoas gostam do que você faz e estão sempre que­rendo mais.

-   O que eu não entendo é como esse fato pode fazer com que meu ateliê tenha fracassado.

-   O pensamento no qual acreditamos tem muita força. Se ele é verdadeiro, positivo, leva-nos ao su­cesso, se negativo, empurra-nos para o fracasso. Nós somos responsáveis por tudo quanto nos acontece nesta vida.

-   Neste caso, além de ter boa contabilidade, te­remos de aprender a pensar do jeito certo - tornou Margarida. 

-   Isso mesmo. Depois que assisti a algumas aulas aqui, minha vida mudou muito - considerou Jacira.


-   Vocês podem continuar vindo às aulas aos sá­bados como minhas convidadas. Eu gostaria de trocar ideias com vocês e contribuir de alguma forma com seus projetos. Podem contar comigo. Agora eu gostaria de saber como pretendem iniciar o empreendimento.
Margarida explicou o que estavam fazendo, os resultados positivos que alcançaram e a vontade de deixar o emprego e trabalhar por conta própria.

Depois, Jacira perguntou:

-   Devemos deixar a oficina ou continuamos mais algum tempo como estamos?

-   Vocês fizeram as contas e não há dúvida de que é melhor começar já.

Jacira olhou para Margarida e seus olhos brilhavam:

-   Então, vamos deixar a oficina?

-   Vamos! Desta vez tudo vai dar certo.

Ernesto aconselhou-as a procurar um escritório de contabilidade para abrir uma empresa, colocando-se à disposição para auxiliá-las em tudo e acompanhar o de­senrolar das atividades.

Depois de combinarem todos os detalhes, as duas radiantes, deixaram a casa de Ernesto e voltaram para a casa de Margarida bem animadas.

Para adiantar o serviço, Jacira ficou trabalhando até mais tarde. Eram mais de onze e meia quando ela entrou em casa.

As luzes estavam apagadas e ela ficou aliviada. Seus pais deveriam estar dormindo e assim não teria de suportar as costumeiras reclamações da mãe que não se conformava com suas novas atitudes.

Sentiu sede e foi à cozinha. Quando tomava água, Geni apareceu, de camisola, dizendo nervosa:

- Finalmente chegou! Onde esteve até esta hora? Já é meia-noite! Uma moça de família não anda na rua até esta hora!

Jacira não se incomodou, acabou de tomar a água, colocou o copo sobre a pia e respondeu:

-  Os tempos mudaram, mamãe. Tinha muita gente na rua.

-  Não me conformo em ver como você tem se comportado. Nem parece a mesma pessoa que eu eduquei com tanto carinho. Esquece que tem pais idosos que precisam de atenção e de ajuda?
Jacira deu de ombros:

-  Pelo que sei vocês gozam de boa saúde, não são inválidos e podem cuidar de si mesmos. Não lhes falta comida, remédios, eu continuo cooperando com os serviços da casa.

-  Mas hoje é sábado, dia de passar a roupa da semana e você desapareceu desde cedo e o cesto está cheio.

-  Sei disso. Amanhã cedo eu passo tudo, mas à tarde vou sair.
- De novo? Vai nos deixar sozinhos?

Jacira olhou nos olhos dela e disse com voz firme: 

- Minha vida está mudando e vai mudar muito mais. Vou trabalhar muito e você vai precisar cooperar mais.


-  Eu? Como assim? Estou cansada, trabalhei a Vida inteira e mereço descansar.

-  Você vai ter de cuidar mais de vocês. Eu não terei tempo para fazer muitas coisas em casa.

-  Não estou entendendo. Que eu saiba você con­tinua na oficina e sai às cinco e meia da tarde todos os dias. Dá muito bem para fazer o serviço da casa.

-  Vou sair da oficina e trabalhar por conta pró­pria. Não terei horário.

-  Você enlouqueceu? Vai deixar um emprego fixo, com carteira assinada para fazer o quê? Você não sabe fazer nada, não tem profissão.

-  Sei o que estou fazendo. Eu e minha amiga Mar­garida vamos costurar para fora. Está tudo combinado.

-  Não é possível que você seja tão descabeçada. Onde já se viu? Vamos todos morrer de fome.

Jacira olhou-a com raiva e respondeu: Durante toda minha vida você me colocou para baixo. Não acredita que eu possa ser inteligente, capaz e tenha qualidades. Por quê? Fez-me acreditar que eu era muito feia, insignificante, incapaz, e me fez perder os melhores anos da minha juventude. Mas agora chega! Você não vai mais me impedir de seguir em frente, de fazer o que tenho vontade. 

Vou progredir, ganhar dinheiro, ter uma vida melhor! Eu mereço viver sem precisar contar os centavos para comprar o essencial. 

Você tem uma cabeça pobre e por esse motivo nós sempre temos vivido na miséria! Não importa o quanto eu tenha trabalhado, o dinheiro nunca nos favoreceu. Você, com suas ideias nega­tivas, impediu-nos de prosperar. Agora que eu estou conseguindo sair dessa condição em que nos colocou, você ainda tenta me segurar?

- O que está dizendo? Eu sou culpada por seu pai ser apenas um operário, estar desempregado e você não saber fazer nada para ter um emprego melhor? Eu? Uma pobre mulher que não teve chance nesta vida, que se casou mal, foi abandonada pelos filhos e nunca teve sorte?

Geni chorava inconformada com o que ouvira. Ja­cira olhava-a séria sem comover-se com suas lágrimas e respondeu:

- Você se coloca na posição de vítima, o que cer­tamente não é. 
Reage muito forte sempre que se sente ameaçada. Mas é bom saber que de hoje em diante vou cuidar da minha vida do jeito que acho certo. Se não concordar, posso me mudar, ir embora de casa.

Geni parou de chorar e olhou-a assustada. Al­guma coisa no tom de Jacira a fez perceber que ela estava falando sério. Decidiu não facilitar. Enxugou as lágrimas e disse lamentosa:

- Nunca pensei que você fosse capaz de nos aban­donar. Pensava que fosse diferente de seus irmãos que nos deixaram. Mas vejo que estava enganada. Você é capaz de fazer o mesmo. O que será de nós, velhos, pobres,
abandonados? Só nos restará ir para um asilo, viver da caridade alheia. Isso depois de ter criado três filhos e feito tudo por eles.

-  Pare de se lamentar. Mesmo que um dia eu saia de casa, não deixarei que lhes falte nada. Pode parar de querer me impressionar. 

Você sabe que não sou egoísta, sempre gastei com vocês todo dinheiro que ganho na oficina.

-  Mas você mudou! Quem me garante que amanhã também não nos abandonará?

- Chega, mãe. Estou cansada e vou dormir. Jacira afastou-se, foi para o quarto. Geni abriu o
armário, apanhou a lata onde guardava as bolachas, pegou duas e começou a comê-las com prazer. Depois, tomou água e subiu para dormir.

Entrou no quarto onde Aristides, deitado de costas, roncava. 
Estendeu-se ao lado dele, empurrando-o com o pé, como sempre fazia, para que ele se virasse e parasse de roncar.

Ele resmungou algo que ela não entendeu, virou-se e o ronco cessou, ela acomodou-se pensando no que Jacira lhe dissera. No dia seguinte conversaria com Aris­tides, exigindo dele uma atitude mais autoritária com a filha. Afinal, esse era o papel do pai. Depois, virou de lado e logo adormeceu.

Na manhã seguinte, Geni acordou cedo, le­vantou-se e prestou atenção nos ruídos que vinham da cozinha. Deduziu que Jacira estava tomando café e deitou-se novamente. Não desejava encontrar-se com ela. Queria que ela pensasse que ainda estava na cama, triste, sem ânimo, por causa da conversa da noite anterior.

Ela dissera que iria deixar o emprego. Seria a maior loucura. Precisava fazer alguma coisa para im­pedi-la. Sem emprego, o que seria deles?

Talvez ela estivesse pensando mesmo em deixá-los, como seus irmãos fizeram. Tinha que evitar isso a todo custo. Aristides, ao seu lado, ressonava tranquilo. Irri­tada, sacudiu-o chamando:
- Acorda, Tide. Vamos. O teto está caindo sobre nossa cabeça e você continua placidamente dormindo.

- Ah! Ah! - resmungou ele sem abrir os olhos.

- Acorda, homem. Você precisa fazer alguma coisa. Vamos!
Ele abriu os olhos fixando-a ainda sem entender o que estava acontecendo.

Ela continuou sacudindo-o:

-  Acorda, vamos...

-  O que foi, mulher? Aconteceu alguma coisa?

- Não aconteceu ainda, mas vai acontecer uma desgraça. Você tem de evitar que Jacira acabe com a nossa vida!

-  Jacira? Como assim? Você deve estar sonhando. Deixe-me dormir.

-  Nada disso. Você precisa fazer alguma coisa. Sabe o que ela disse ontem à noite? - Sem dar-lhe tempo de responder continuou: - Vai pedir demissão do emprego. Já imaginou o que vai nos acontecer?

Aristides franziu o cenho, sentou-se na cama dizendo: 
 

- De onde você tirou essa ideia? Ela não é louca de fazer uma coisa dessas.


-  Foi o que ela disse que vai fazer. Como eu fui contra ameaçou até ir embora de casa.

Aristides passou a mão nos cabelos meneando a cabeça negativamente:

-  Não acredito que faça isso. Você vive cutucando ela com vara curta, exigindo isso ou aquilo. Vai ver ela perdeu a paciência. Foi isso. Falou só para assustá-la.

-  Nada disso. Eu não briguei com ela. Só per­guntei onde tinha estado até àquela hora. Passava da meia-noite. Então ela respondeu que eu precisava me acostumar em fazer o serviço da casa porque daqui para a frente, só vai fazer o que tem vontade. Vai deixar a oficina e trabalhar por conta própria.

-  Foi isso? Vai ver que arrumou um emprego melhor.

-  Não. Ela vai encontrar-se com aquela amiga. Sempre fui contra essa amizade. Essa colega está en­chendo a cabeça dela de besteiras. Você tem de falar com ela já.

Aristides deitou-se de novo dizendo:

-  Mais tarde eu falo. Quero descansar.

-  Já é tarde. Ela disse que ia passar a roupa e sair em seguida.
Aristides bufou nervoso. Para ele não havia coisa pior do que ter de levantar-se em um domingo para discutir com a filha. Geni sempre o obrigava a fazer isso. Ele obedecia mesmo sem vontade, apenas para que ela o deixasse em paz.

Não sabia o que era pior, ter de brigar com a filha contra sua vontade ou ouvir as reclamações de Geni obrigando-o a fazer coisas desagradáveis.

Fechou os olhos, tentou dormir, mas Geni le­vantou-se, abriu a janela. O sol entrou forte e ele pro­testou. Ela tornou decidida:

- Vamos, homem. É melhor agir agora do que chorar depois.
Aristides levantou-se nervoso, sabia que ela ngo o deixaria mais dormir. Foi ao banheiro, lavou-se lentamente querendo de alguma forma provocá-la mas quando voltou ao quarto, Geni, já vestida, esperava-o decidida.

Ele não teve alternativa senão fazer-lhe a von­tade. Quando os dois desceram as escadas, Jacira es­tava passando a última peça de roupa.

Geni aproximou-se, mãos na cintura esperando desafiadora que Aristides falasse.

Jacira continuava passando uma toalha calmamente.

-   Filha - começou ele sério -, sua mãe me disse que você vai pedir demissão do emprego. Claro que não acreditei que fosse fazer essa loucura. Mas ela insiste que é verdade. O que me diz?

-   É verdade, sim. Amanhã vou pedir demissão da oficina.
- Eu não disse? - declarou Geni triunfante.

-   E como é que vamos viver sem o seu salário?

-        Vou montar um ateliê de costura com uma co­lega. Não se preocupe. Nada vai lhes faltar. Ao con­trário. Vou ganhar muito mais. 

Aristides meneou a cabeça negativamente e respondeu:


-   Não entre nessa ilusão. Você não tem pro­fissão. Deveria dar graças a Deus por ter sido aceita naquela oficina.

-   Estou decidida. Vocês não vão me convencer do contrário. Sei o que estou fazendo.

-   Você não pode deixar que ela faça isso. O que vai ser da nossa vida? Morreremos de fome.

Jacira olhou-os admirada. Apesar de saber que rea­giriam contra não imaginou que fossem tão veementes.

Não se interessaram em saber de seus projetos, não perguntaram que tipo de negócio ela iria fazer, apegavam-se ao pequeno salário que recebia, conde-nando-se a viver a vida inteira naquela penúria.

Os dois lhe pareceram parados no tempo, sem nenhuma motivação de progresso, acomodados em uma vida pobre onde viviam contando as moedas.

Jacira dobrou a toalha, desligou o ferro, e disse calmamente:

- Pronto, mãe. Já passei tudo. Fica a seu cargo guardar.

Foi saindo e Geni interceptou-lhe os passos.

- Aonde vai? Certamente para a casa daquela amiga que anda enchendo sua cabeça com todas essas bobagens.

Sem se perturbar Jacira respondeu:

- O nome dela é Margarida. Uma mulher ma­ravilhosa, que trabalha muito e como eu deseja melhorar de vida. Vocês deveriam agradecê-la pela oportunidade que está me oferecendo de conquistar uma vida melhor.

Jacira afastou-se, apanhou a bolsa e ia sair quando Geni colocou-se na frente da porta dizendo:

- Pelo visto você está de cabeça feita. Mas saiba que se fizer o que deseja vai destruir nossa vida.

Jacira segurou o braço dela afastando-a, abriu a porta e saiu sem dizer mais nada. Geni, revoltada, olhou o marido:

- Você não faz nada? Deixa que ela nos desres­peite dessa forma? É o fim. Onde foi que eu errei? Por que Deus nos castiga desse jeito? Filhos malvados e um marido que não lhes dá uma lição?

Aristides, no auge da irritação, tornou:

-   Não jogue a culpa de tudo em cima de mim. Seus filhos foram embora porque você vivia se in­dispondo com eles. Se não tomar cuidado, Jacira vai acabar fazendo o mesmo. Ela quer melhorar de vida e tem o direito de experimentar.

-   Vai me dizer que ela está certa? Já pensou no que pode nos acontecer?

- Se precisar vou aceitar qualquer emprego, mesmo que seja para baixar o salário na carteira. E melhor você parar de se lamentar. Vou tomar um café e você trate logo de cuidar do almoço.

- Agora é você que me culpa de tudo. Que falta de sorte a minha!

-  Poupe-me de suas lamúrias. Não quero ouvir mais nada. Depois do café quero ler meu jornal em paz.


Ele foi à cozinha, tomou uma xícara de café, apa­nhou o jornal e prazerosamente acomodou-se em sua poltrona favorita. Estava cansado dos problemas domés­ticos. Naquele momento não queria pensar no futuro.
 

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