quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Capítulo 12 

Na manhã seguinte, na casa de Margarida, Jacira desabafou:


-  Vou acabar meu namoro com Nelson. 

Margarida olhou-a surpreendida:


-  Por que, aconteceu alguma coisa?


- Ele está irritado porque não tenho tido tempo para sair. Quer que eu deixe de trabalhar e vá morar com ele. Veio com uma conversa de que ele pode me sustentar, dar-me conforto, mas eu quero muito mais. Eu quero ser independente e ele quer me pôr na co­leira, mandar em mim.


-  Por esse motivo é que eu não quis me casar de novo. Mas eu já experimentei o amor, tenho meu filho e me sinto bem assim. Mas você está começando sua vida amorosa. Se acabar o namoro, não vai se arrepender?


-  Sabe que não? Tem dia que me sinto bem em conversar com ele, mas há outros que quando estamos juntos não vejo a hora de ir embora.


-  Nesse caso, é melhor terminar mesmo. Você não o ama.


-Pode ser. Mas eu estou descobrindo que posso ter uma vida melhor. Pela primeira vez sinto prazer em trabalhar, adoro ouvir nossas freguesas elogiarem nossos vestidos. Sinto-me útil, realizada. 
Gosto de manusear esses tecidos tão lindos, aprender a olhar a moda, sentir que estou viva.


Margarida sorriu e respondeu:


-   É o que eu sinto também. Que bom que você me entende! O prazer de fazer, de criar coisas bonitas me fas­cina. Você está certa de que é isso mesmo que quer?


Jacira suspirou pensativa:


- Só não sei como dizer a ele. Parece que o estou rejeitando, sendo ingrata, cruel. Ele foi o primeiro homem que gostou de mim. Eu tenho me esforçado para gostar dele. Mas ontem, quando ele me beijou, eu queria sair correndo.


Margarida colocou a mão sobre o braço da amiga e tornou:

-   No amor não há como fingir. Quando você ama, quer ficar junto.

Se em vez disso, não tolera a intimi­dade, o melhor mesmo é sair fora. Dizer que não está preparada. Ele vai sofrer, mas respeitar sua atitude. Seria cruel fingir um amor que não sente.


-   Você está certa.


-   Aquela mulher que você conheceu no ônibus, acertou.


-   Como assim?


-   Ela disse que sua vida ia mudar até no lado afe­tivo. Isso significa que você vai gostar de outro.


-   Será? Duvido. Nelson foi o único que me viu como mulher.


-   Isso foi no tempo em que você era triste, de­primida. Hoje você está muito diferente. Vai aparecer outro, sim.


Jacira sorriu, pegou a bolsa, apanhou o cartão da mulher que conhecera no ônibus e leu: 


- Lídia Martini. Ela disse que mora perto daqui e convidou-me para ir a sua casa a fim de conversarmos. Estou com vontade de ir até lá. O que você acha?


- Se você for, eu vou junto para ver o que ela pode dizer sobre minha vida. Se ela for como o seu Norberto, pode nos ajudar e aconselhar.

Margarida olhou o cartão e continuou:

-  Essa rua fica aqui perto, podemos ir a pé. Seria bom irmos antes de o Marinho voltar da escola.

-  E o vestido de d. Odete? Ela ficou de vir expe­rimentar amanhã.

-  Está bem adiantado. Estou morrendo de curio­sidade.

-  Está bem. Vamos.

As duas saíram e em dez minutos estavam to­cando a campainha da casa. Enquanto esperavam no pequeno portão de ferro, contemplavam encantadas o jardim onde um belo pé de primavera, cheio de flores, subia ao lado da varanda.

Uma mocinha abriu a porta e vendo-as apro­ximou-se:

-  Meu nome é Jacira, e esta é minha amiga Marga­rida. Gostaríamos de conversar com d. Lídia. Ela está?

-  Está sim. Um momento, vou avisá-la.

Ela entrou novamente na casa e alguns segundos depois, voltou acompanhada por Lídia que, vendo-as, sorriu, abriu o portão e convidou-as a entrar.

-  Eu sabia que viria.

-  Esta é minha sócia, Margarida.

Lídia olhou-a firme nos olhos dela e disse:

-  É um prazer recebê-las em minha casa.

-  Adorei seu jardim. O que faz para que as flores sejam tantas e tão bonitas? - perguntou Margarida.

-  Elas gostam de ficar aqui porque sabem que são muito amadas. Eu adoro este jardim e elas retribuem.

Entraram na sala e Lídia, aproximando-se da mo­cinha que as recebera, disse:

- Esta é minha filha Estela. É ela quem cuida do nosso jardim.
- Está muito bonito. - Disse Margarida, con­tinuando: - Desculpe termos vindo fora de hora, é que mais tarde meu filho chega da escola e eu não poderia mais sair. Eu desejava muito conhecê-la.

- Fizeram bem. Sentem-se, vamos conversar. Depois de vê-las acomodadas no sofá, Lídia, vol
tando-se para Jacira, tornou:

-  Você veio porque as coisas que eu disse começaram a acontecer.

-  É. De fato. Há algum tempo minha vida vem mudando. Tenho tomado decisões. Algumas, eu sei que foram acertadas, mas...

-  Há uma que você sabe que deve tomar, mas fica dividida pelo receio de decepcionar uma pessoa para a qual é muito grata. 

-  Isso mesmo. Meu namorado quer que eu vá morar com ele e deixe de trabalhar. Isso eu não vou fazer.


-  Vocês estão trabalhando por conta própria e adoram o que estão fazendo. Eu sinto que terão mais sucesso do que esperavam.
Lídia fechou os olhos durante alguns segundos, depois disse:

- A amizade de vocês vem de outras vidas, quando pertenceram a mesma família. Têm grande afinidade espiritual. Você, Margarida, sempre lutou para con­seguir melhorar de vida, mas nada dava certo. Teve algumas decepções que a fizeram sofrer, mas nunca se entregou à depressão. Sempre lutou com coragem e alegria. 

Ao reencontrar Jacira, que também não era feliz, você sentiu vontade de ajudá-la. Unidas, encon­traram motivação para mudar e progredir.

A voz de Lídia estava um pouco modificada e ela falava com firmeza e doçura. As duas ouviam como­vidas, percebendo que havia alguma coisa diferente no ar. Parecia-lhes que de repente o ar se tornara mais leve e um sentimento de alegria as envolvia.

Depois de alguns segundos em silêncio, Lídia per­guntou:

- Quem é Hélio? Margarida estremeceu, mas não respondeu, Lídia
continuou:

- É um homem alto, moreno, rosto cheio, cabelos lisos penteados para trás, veste uma camisa azul, está
mostrando um anel de ouro, de formatura com uma pedra vermelha.

-  Meu Deus, é o pai do Marinho!

-  É esse mesmo. Ele pede para eu lhe dizer que está muito arrependido do que fez, deseja que o perdoe.

Margarida, trêmula, não conseguia conter as lágrimas:

- Eu não tenho raiva dele. Também tive culpa pelo que aconteceu.

- Diz que você deveria ter lhe contado sobre Marinho. Ele os teria amparado e você não teria so­frido tanto. Nunca se conformou com seu desapare­cimento e só agora, depois que ele morreu, foi que descobriu tudo.

Margarida chorava, enquanto Jacira segurava a mão dela tentando dar-lhe coragem.

-  Não sabia que ele tinha morrido! Como foi isso?

-  Foi de repente, do coração. Faz mais de um ano.

-  Eu nunca soube! - murmurou Margarida en­quanto as lágrimas continuavam a banhar-lhe o rosto emocionado.

-  Ele precisa ir embora, melhorar. Quando puder, voltará para protegê-la e ao menino. Admira sua co­ragem e a mulher que você é.

Entendeu que você de­sapareceu da vida dele para não criar problemas com sua esposa e seus outros filhos. Lamenta não tê-la ajudado quando mais precisava.

Lídia calou-se. Respirou profundamente, abriu os olhos e disse:

- Vamos mentalizar uma luz azul-clara e envolvê-lo com amor, desejando que ele se recupere logo.

Ela fez uma oração que as duas acompanharam em pensamento. Depois, abriu os olhos, levantou-se e voltou em seguida trazendo uma bandeja com copos e uma jarra de água, colocando-a sobre a mesa. Encheu os copos e deu-os às duas, servindo-se também.


Tomaram a água. Quando se sentiu mais calma Margarida quebrou o silêncio comentando:

-  Estou triste, não sabia da morte dele.

-  A morte faz parte da vida. Todos nós teremos que passar por essa viagem. Mas como vocês viram ela não é o fim de tudo. É apenas uma mudança de estado e de lugar, nós continuaremos vivendo em ou­tras dimensões.

-  Eu tenho um amigo que muito me ajudou, chama-se Ernesto Vilares. Trata-se de um homem muito instruído, que estuda os fenômenos da vida e tem me falado sobre todas essas coisas.

-  Já tive oportunidade de fazer alguns cursos com ele e considero-o um mestre no assunto. Fico feliz que vocês o conheçam. Se puderem, frequentem o Insti­tuto dele - respondeu Lídia com alegria.

-  Eu já assisti a algumas aulas. Ele deu-me uma bolsa e eu aproveitei. Suas palavras mudaram a minha vida.

Jacira contou como o conhecera e as experiências que tivera quando dormira e conhecera uma mulher cha­mada Marina, que disse ser sua protetora, e finalizou:

-  Eu estava me sentindo tão bem, tão feliz, que quando acordei reclamei. Preferia continuar dormindo.

-  Eu a conheço. No dia em que se sentou ao meu lado naquele ônibus, eu a vi perto de você. Foi ela quem pediu que lhe desse meu endereço.

- É incrível! - comentou Margarida. - Sempre ouvi falar de espíritos, algumas vezes cheguei a ir a um Centro Espírita, mas tive medo de voltar lá. Minha mãe dizia que é um lugar perigoso.

-   As pessoas têm medo do que não conhecem e não podem controlar. Mas os espíritos são pessoas comuns, que viveram aqui e continuam como eram do outro lado da vida, tendo qualidades e pontos fracos. De um modo geral, não podem nos fazer mal. Só con­seguem nos envolver de forma negativa quando não valorizamos a vida, depreciamo-nos, ficamos no mal-São nossas fraquezas que lhes abre a porta da nossa intimidade. Quando estamos no mal não atraímos só espíritos perturbados, mas também pessoas que podem nos prejudicar.

-  O que aconteceu hoje abriu minha cabeça, desde que Jacira falou de você, senti muita vontade de conhecê-la. Mas pensei que fosse para saber se nosso negócio ia dar certo. O que aconteceu aqui foi uma prova muito grande de que a vida continua de­pois da morte. E isso, para mim, é mais importante que tudo.

-  De fato. A prova de que somos eternos nos co­move e amplia nossos horizontes. Saber dessa reali­dade é uma benção que devemos agradecer à bon­dade divina - comentou Lídia com os olhos brilhantes de alegria.


-  Gostaria de saber mais sobre esse assunto -tornou Margarida.
-  Voltem aqui sempre que desejarem. Terei prazer em conversar com vocês. Tenho muitos livros de pes­soas que estudaram o assunto e posso emprestar-lhes. São pesquisas que comprovam que a vida continua.
Jacira interveio:

-  Você falou que estou sem coragem de tomar uma decisão. Devo acabar com esse namoro?

-  Essa resposta está dentro do seu coração. Só você pode decidir. 

Pense no assunto, analise seus sen­timentos e decida de acordo com sua verdade. Seja qual for sua decisão, seja sincera. Não tenha receio de ser verdadeira.

-  Eu já pensei e sei o que fazer.

Lídia foi até a estante de livros, apanhou alguns, e mostrou-os para elas dizendo:

- Dois destes são romances espiritualistas ditados Por espíritos aos médiuns. São mais simples e fáceis de entender. Os outros são estudos feitos por cien­tistas sobre os fenômenos da mediunidade. Eu gosto muito deste - continuou Lídia apanhando um deles: - 

Chama-se Fatos espíritas e foi escrito por Sir William Crocks, um cientista inglês. Trata-se de um caso de materialização que ele pesquisou. Ele provou que a vida continua depois da morte do corpo físico. Tem fotos do espírito materializado.

- Como foi isso? - indagou Jacira admirada.

- É melhor você levar e ler. É muito interessante - disse Lídia.
Jacira segurou o livro, folheou-o, e disse admi­rada:

- É incrível! Todas as pessoas deveriam ler isso!

-  Nem todos estão preparados para essa reali­dade. Cada coisa acontece no tempo certo.

-  Agora é o meu tempo. Pode me emprestar? -indagou Jacira.
- Sim.

-  Eu adoro romances - disse Margarida.

Lídia indicou um deles. Ao se despedirem, Marga­rida agradeceu muito a atenção e abraçando-a disse:

- Sinto que encontrei uma amiga. Gostaria de convidá-la para ir conhecer minha casa. Leve sua filha. Terei o maior prazer em mostrar-lhe nosso trabalho.

- Domingo de manhã tenho um compromisso, mas à tarde passarei lá.

- Nesse caso, eu também estarei a sua espera. Elas despediram-se e durante o trajeto de volta,
comentaram com emoção o encontro.  

Recordando que Lídia dissera que seriam bem-sucedidas no trabalho, elas retomaram as atividades com entusiasmo.

Naquela noite, para compensar, Jacira deixou a casa da amiga uma hora mais tarde do que o habi­tual. Apesar disso, estava satisfeita, porquanto tinham adiantado bem a tarefa.


Assim que fechou o pequeno portão do jardim e ganhou a rua, viu Nelson na esquina se aproximando.

Pela sua fisionomia percebeu logo que ele não es­tava bem.

- Faz mais de uma hora que a estou esperando. Tive vontade de tocar a campainha da casa para chamá-la.

- Você sabe que eu não gosto que faça isso.

-Não é possível que vocês tenham tanto tra­balho assim. Acho mais é que vocês ficam conver­sando. Parece que o fato de saber que eu a estou esperando não importa.

Jacira parou de caminhar, olhou bem nos olhos dele e respondeu:

-  Tanto importa que tomei uma decisão.

-  Você vai deixar o trabalho e se mudar para minha casa?

-  Não. Eu não gosto de pensar que você está me esperando. Eu decidi que não quero ir morar com você.

-  Não estou entendendo. Nesse caso...

-  Nesse caso o melhor é acabar com o nosso na­moro. Eu não estou preparada para fazer o que você quer. Eu quero melhorar minha vida, dedicar-me de corpo e alma ao trabalho. Esse é meu objetivo agora. Por esse motivo, é melhor não nos vermos mais.

Ele olhou-a admirado e respondeu nervoso:

- Depois de tudo que eu fiz por você, não espe­rava que me dispensasse como se eu nunca tivesse sido nada em sua vida.

A atitude dele indignou Jacira que colocou as mãos na cintura e retrucou irritada:

-  O que você fez por mim, além de reclamar porque sou uma mulher que trabalha e luta por uma vida melhor?

-  Você está iludida. Acreditou nas bobagens da­quele professor. Mas vai cair do cavalo. A realidade é bem outra. Você não fica rica só porque quer. Quem nasce pobre, morre pobre.

-  Você é um conformado, sem ambições. Há anos curte esse emprego, fazendo tudo sempre igual. Eu não quero isso para mim. 

Vou aprender coisas, me­lhorar de vida, dar conforto a minha família.

-  Sua família tem vivido pendurada em você e vai continuar assim. Estou arrependido pelo tempo que Perdi com você!

-  Pois vá com Deus e me deixe em paz. Nunca mais quero vê-lo.
 
Jacira saiu pisando duro, apertando o livro que segurava e a alça da bolsa. Caminhou rapidamente tentando se acalmar. Chegou no ponto do ônibus que já estava encostando e subiu apressadamente. 

Sentou-se ao lado da janela e quando o ônibus saiu ela ainda viu Nelson olhando com raiva para ela.

Aos poucos, Jacira foi se acalmando e alguns mi­nutos depois, recordando-se da cena de momentos antes, começou a rir. Como pudera pensar que gostava do Nelson? Ela que tivera receio de magoá-lo, agora percebia que ele não era nada do que imaginara. 

Era um homem possessivo, autoritário, que desejava ma­nipulá-la e impedir que ela continuasse progredindo. Se aceitasse o que ele queria, iria se transformar em uma mulher apagada, infeliz e derrotada.


Ela descobrira o prazer de tomar decisões que tinham transformado sua vida para melhor. Não queria de forma alguma voltar atrás. 

Sentia-se mais dona de si, mais forte. Esse caminho não tinha volta. Ao contrário, ela só aceitaria ir para a frente.

As palavras de Lídia confirmaram o que ela sentia. Lembrou-se do espírito de Marina. Ela colocara Lídia em seu caminho. Sentia que podia confiar na amizade dela.

Era prazeroso fazer amigos. Encontrara pessoas que valorizavam sua amizade.

Lembrou-se das palavras de Geni:

"- Não existe amizade sincera. As pessoas são interesseiras e só fazem o que lhes convêm. Eu não tenho amigas. Não confio nelas."

Ela nunca tivera amigas por que sua mãe pen­sava dessa maneira. Acreditara em suas palavras. Re­conhecia agora o quanto estava equivocada.

Havia pessoas boas, capazes de cultivar uma ami­zade. Margarida era uma prova disso. Sentia que Lídia também era confiável e iria se tornar uma boa amiga.

Ela sabia que a mãe pensava daquela forma. Acreditara em tudo que ela lhe dissera. Ficará só e triste. Não se lembrava de vê-la recebendo alguém em casa.

Já o pai tinha vários amigos fora de casa, mas nunca os convidava para visitá-los. Certamente porque Geni não gostava.

Ela não queria ser igual a sua mãe. Gostaria de ter amigos para conversar, compartilhar suas alegrias e tristezas.

Arrependia-se de ter se deixado influenciar pelas ideias de Geni. Por ela pensar dessa forma nunca con­vidara Margarida para ir a sua casa. Era sempre ela quem ia à casa da amiga, mesmo nos dias em que não tinham de trabalhar.

Talvez fosse o momento de mudar isso. Ela não desejava passar o resto da vida em uma casa onde não pudesse receber seus amigos. O que Geni faria se ela levasse Margarida em sua casa?

Jacira desejava mudar, sentia prazer em des­frutar da amizade de pessoas das quais gostava. Era muito agradável trocar ideias com Margarida e agora com Lídia.

Lembrou-se das pessoas que conhecera no es­paço do dr. Ernesto. Eram amáveis, inteligentes, edu­cadas, falavam coisas boas. Quando ia às aulas,  
várias delas se aproximavam para conversar. Contudo, ela se afastara com medo de não ser apreciada.

"- Quem nasce pobre não tem chance na vida. Dê graças a Deus por encontrar o emprego na oficina. Senão, estaríamos morrendo de fome."

De novo as palavras de Geni vinham-lhe à mente. Ou então:

Não adianta querer ser o que não é. Não adianta querer se pintar para aparecer. Você nunca será bonita. Seja discreta. Não deve sair por aí como se fosse uma prostituta".

Essa era a maneira de pensar de sua mãe. Ela já não pensava mais assim. Sabia que havia um bom lugar na vida e percebia que poderia ocupá-lo se quisesse.

Sentia-se com coragem para lutar em busca de uma vida melhor, e o primeiro passo seria livrar-se das crenças que durante a vida inteira ouvira da mãe, e as quais já não acreditava mais.

Ela conseguira mudar de vida, estava trabalhando por conta própria, sendo capaz de sustentar melhor sua família. Um homem havia se interessado por ela beijara-a, quisera viver com ela, sustentá-la. Ela ó havia recusado porque não o amava o suficiente, mas esse acontecimento provara que como mulher tinha condições de encontrar alguém que a amasse de ver­dade e com o qual construiria sua família.

Sentia-se livre, capaz, feliz e forte. Tinha toda uma vida pela frente para construir sua felicidade.

Chegou em casa e encontrou Geni sentada na sala lendo uma de suas revistas. Vendo-a entrar comentou:

- A cada dia você chega mais tarde. Onde ficou até esta hora?

Apesar do tom malicioso, Jacira não se incomodou e respondeu:

- Trabalhando. Temos tido muito serviço. Amanhã vou receber e no sábado você vai comigo ao super­mercado fazer as compras do mês.
- Eu?! Não tenho saúde para essas andanças.

-  Você nunca sai de casa. Está na hora de dar uma volta, respirar um ar.

-  Eu sou doente, canso-me com facilidade. Não vou aguentar.

-  Vai sim. Andar faz bem à saúde. Não vai precisar carregar nada.

Eu vou mandar entregar. Depois, estou pensando em lhe comprar algumas peças de roupa.

Geni arregalou os olhos:

- Para mim?

- Sim. Ganhei um pouco mais e quero que es­colha alguma coisa no bazar.

Os olhos de Geni brilharam quando ela res­pondeu:

-   Vamos ver se consigo ir. Jacira sorriu e Geni continuou:

-   Deixei comida no forno.

- Comi com Margarida, vou só tomar um café com leite.

Jacira foi à cozinha e notou que não havia ne­nhuma louça suja. 

Geni limpara tudo. Sentiu-se feliz. Tomou seu café com leite e bolachas, depois
foi para o quarto. Sentia-se calma e com sono. Lavou-se, vestiu a camisola, deitou-se e em poucos minutos adormeceu.

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