Conforme combinado, Ester voltou a procurá-las.
Estava
muito elegante, olhos brilhantes irradiando alegria. Depois dos cumprimentos,
Margarida brincou:
- Você remoçou! O amor está
lhe fazendo bem!
- Você nem imagina quanto!
Já me mudei para a casa de Renato.
Estamos muito felizes!
- Dá para notar! Parabéns! - tornou Jacira sorrindo.
- Vim levá-las para
conhecerem Renato e a casa de que lhes falei.
Estou com o carro na porta e
ansiosa para decidirmos tudo.
As duas entreolharam-se
indecisas e Ester não lhes deu tempo para responder:
- Vamos logo. Renato está
nos esperando. Não vamos demorar.
- Está bem. Vamos? - indagou Margarida olhando Para a amiga.
- Vamos.
As duas se arrumaram
rapidamente e acompanharam Ester:
- Este
é Jorge, nosso motorista. As duas olharam o carro elegante, o motorista
bem-arrumado
e sentiram-se acanhadas. Ester não lhes deu tempo de dizer nada. Fê-las entrar
no carro e sentou-se também:
- Pode
ir, Jorge.
Jacira sentia-se emocionada. O carro macio e
o perfume gostoso que vinha de Ester fê-la lembrar-se das palavras da mãe:
Quem nasce pobre, morre pobre. Não adianta
fazer nada".
Isso
era mentira. O mundo estava cheio de pessoas que pensavam diferente,
esforçaram-se, acreditaram que mereciam uma vida melhor e conseguiram. Lá
estava ela, em um carro de luxo, ao lado de uma grande amiga e de uma mulher
que estava interessada em ajudá-las. Mesmo que aquele negócio não desse certo,
dava para acreditar que quando você faz o seu melhor, tudo pode mudar.
Lembrou-se
das aulas que assistira do dr. Ernesto onde ele ensinava tudo isso e afirmava
categórico:
Além
de fazer a sua parte melhorando seus conhecimentos para crescer e progredir,
você precisa cultivar a generosidade, a honestidade. As bênçãos que a vida dá a
alguém devem ser compartilhadas. A ganância, a mesquinhez, o egoísmo limitam a
conquista da felicidade. Alguns até podem progredir financeiramente, mas a
infelicidade vai acompanhá-los".
Ester
conversava animadamente com Margarida, Jacira seguia em silêncio pensando que
se a vida lhe desse a oportunidade de melhorar, saberia aproveitar, ajudar sua
família e quem mais aparecesse em seu caminho.
Ela
sempre vira a mãe como uma mulher preguiçosa, implicante, mal-humorada, ignorante. Mas
aquela tarde que fora às compras com ela, percebeu o quanto ela se colocara à
margem da vida.
Mergulhada na desesperança, cultivando pensamentos
depressivos, Geni perdera
o gosto pela vida. Suas reclamações constantes eram uma forma ainda que
inconsciente de pedir socorro, de dizer o quanto estava triste. Pela primeira
vez, Jacira entendeu por que ela se apegara tanto às fotonovelas. Foi
a forma que Geni encontrou
de sentir alguma emoção, de viver as histórias dos outros e esquecer a própria
vida.
O
carro parou e Ester disse alegre:
- A
conversa estava tão boa que nem vi o tempo passar. Chegamos!
O
carro tinha passado pelo grande portão, circulado pelo belo jardim e todos se
encontravam na entrada da casa. O motorista abriu as portas e elas desceram. A
casa era antiga, mas muito bem cuidada conservando toda sua beleza.
As
duas estavam um tanto acanhadas, e Ester brincou:
- Vamos
entrar! Fale alguma coisa, Jacira! Nós falamos tanto e você veio tão calada!
- Estava
admirando a beleza do lugar!
- É
uma casa maravilhosa! - comentou Margarida.
- Eu
também acho. Mas quem mora dentro dela, vale mais do que tudo isso. Eu casaria
com ele mesmo que não tivesse nada. Ele é meu tesouro!
- Ela
está apaixonada! - tornou Margarida sorrindo.
- Estou
mesmo. Venham, vamos entrar. Subiram os degraus da varanda e entraram. Ester
levou-as
até a sala e antes que se acomodassem, um homem de estatura mediana, rosto
claro, cabelos castanhos, muito elegante, aproximou-se, abraçou Ester
beijando-a na face. Depois, fixou seus olhos penetrantes e vivos nas duas
visitantes.
- Então estas são suas
melhores amigas! - exclamou ele. Sua voz era agradável, mas firme.
Depois
das apresentações, elas se sentaram e ele disse sério:
- Ester
disse que vocês são empreendedoras. Têm um negócio próprio.
- É
verdade - respondeu Margarida. - Por enquanto ainda é pequeno. Mas pensamos
que temos tudo para crescer e prosperar.
- É
um ateliê de costura. Margarida é muito boa profissional, eu estou aprendendo,
mas estamos nos esforçando para melhorar.
- Há
quanto tempo estão trabalhando?
- Há
cerca de seis meses. Tempos atrás eu montei um ateliê, mas apesar de ter muitas
clientes, fracassei.
- A
que você atribui o fracasso?
- Bem,
eu não valorizava o trabalho. Tinha vergonha de cobrar. Não queria parecer
gananciosa.
- Pensando
desse jeito jamais iria prosperar. O trabalho bem feito merece o preço justo.
Nem mais nem menos.
- É o
que eu penso - interveio Jacira.
Renato
falava olhando dentro dos olhos delas e as duas sentiam-se fascinadas porque
ele conversava com naturalidade, fazendo-as sentir-se à vontade, apesar de elas
não estarem habituadas àquele ambiente. Parecia-lhes conhecê-lo há muito
tempo.
As
duas contaram como se conheceram e Jacira relatou suas experiências com as
aulas do dr. Ernesto.
- Eu o
conheço muito e admiro. Além de um profissional gabaritado, é um homem
excepcional. Vocês ainda estão indo às suas aulas?
- Margarida
nunca foi e eu por enquanto parei por conta do trabalho. Mas adoro ir lá e
algum dia ainda voltarei para aprender mais. Foi depois de conhecê-lo que
comecei a olhar a vida de maneira diferente.
Renato
ficou pensativo por
alguns instantes e Jacira notou nos olhos dele um brilho de tristeza. Foi
apenas um segundo, porém ela sentiu que ele devia ter vivido alguma experiência
muito dolorosa em alguma época de sua vida.
Os
olhos dele voltaram a brilhar com alegria e Jacira ficou em dúvida se o que ela
tinha sentido era verdadeiro.
Continuaram
conversando até que Renato tocou no assunto que as interessava. Falou da casa
vazia, das dificuldades que tivera com inquilinos, e que fora aconselhado pelos
advogados a vendê-la e aplicar o dinheiro em um negócio mais rentável. Ele
explicou:
- Eu
não quis. É uma casa que pessoas muito queridas da minha família construíram,
moraram e foram muito felizes. Na verdade, sou um sentimental. Ester sugeriu
que a emprestasse a vocês e eu achei a ideia muito boa.
As
duas iam responder, mas ele pediu:
- Não
digam nada agora. Vamos até lá e depois conversaremos.
A
casa era antiga, mas estava bem conservada.
- Eu
mandei restaurar há pouco tempo e deixei-a igual a quando foi construída.
Depois de verem tudo, Ester perguntou:
- E
então? Não é linda?
- É...
- respondeu Margarida. - Mas é muito grande... Nosso negócio é pequeno... Não
vai dar...
- Bem
que eu gostaria - aduziu Jacira -, mas não temos capital para começar. Este é
um bairro de luxo. Nós estamos instaladas em uma casa simples, em um bairro
pobre.
- Mas
apesar disso, vocês conseguiram ter uma clientela de nível elevado. Já
encontrei lá mulheres de muita classe - opinou Ester.
- Para
nos instalarmos aqui, teríamos de fazer um ateliê melhor, de acordo com o
lugar. Precisaríamos de dinheiro. Depois que deixamos a oficina para
trabalharmos por conta própria, nossa situação financeira melhorou, mas ainda
não deu para formarmos um capital.
- Você
fez algum curso de administração empresarial? - indagou Renato.
- Não.
Eu fiz o ensino fundamental I. Não foi possível cursar uma faculdade.
- Sua
forma de pensar prova que você sabe o que é preciso para iniciar um negócio.
Quer dizer que se vocês tivessem capital para instalar-se aqui, aceitariam
nossa proposta?
Os
olhos de Jacira brilharam quando ela respondeu:
- Seria
maravilhoso! Mas no momento não temos como dar esse passo.
- Não
tenha pressa. Vocês têm todo tempo para estudar o assunto, pensar. Não vou
mesmo alugar a casa para ninguém. - Ele fez ligeira pausa, depois perguntou: -
Vamos imaginar que vocês tivessem esse dinheiro. Como montariam um ateliê aqui?
As duas se entusiasmaram e começaram a planejar
onde montariam cada seção. Os dois observavam admirados. Apesar das duas serem
pessoas simples revelaram bom gosto e certo conhecimento.
conhecido,
fora o espaço de Ernesto e lá percebera a beleza de um lugar harmonioso, cheio
de coisas bonitas.
Ester
lembrou que seria bom elas morarem na casa. Porquanto, além de ser muito
prático e econômico, faria o trabalho render mais.
- Isso
para mim seria maravilhoso - considerou Jacira -, mas não posso deixar meus
pais. Eles dependem de mim.
- Eles
são doentes? - indagou Renato.
- Não.
Meu pai passou dos sessenta e minha mãe está quase lá.
- Ele
trabalhava em quê?
- Foi
operário qualificado em uma fábrica durante mais de vinte anos. Despedido
quando passou dos cinquenta
anos, ele nunca se conformou. Quis trabalhar, mas não conseguiu
trabalho. Durante anos vivemos só com o dinheiro que eu recebia na oficina e
sua aposentadoria. Quando deixei a oficina eles ficaram com medo que eu não
conseguisse ganhar o suficiente.
- Você
foi corajosa - comentou Renato.
- Eu estava cansada da miséria
em que vivia e re solvi virar
a mesa. Margarida me incentivou e propôs sociedade. Só deixamos a oficina
quando percebemos que estávamos ganhando mais do que o salário.
Foi a melhor
coisa que fizemos. Jacira sorriu e continuou:
- Sabem
o que aconteceu? Papai encontrou um ex-colega de trabalho, que foi mais
previdente do que ele. Quando foi demitido, com a indenização, montou um bar
onde ele e a esposa trabalham.
Eles precisavam de um garçom e o contrataram.
- Deve
ter sido ótimo para ele! O trabalho faz bem ao espírito. Eu não gostaria de
ficar em casa sem fazer nada. Seria horrível! - declarou Renato.
- De
fato. Ele remoçou, às vezes chega cansado, mas muito feliz.
Fez novos amigos,
está mais falante, conta coisas que acontecem no bar.
- Sua
mãe deve estar feliz! - tornou Renato.
- Ela
não está. Reclama o tempo todo que está sozinha, abandonada. Eu saio muito cedo
e chego bem tarde. Ela não se conforma de ter de cuidar da casa sozinha. Estou
pensando em pagar alguém para ajudá-la no trabalho doméstico. Mas por enquanto
ainda não posso.
Eles
conversaram durante mais algum tempo, já havia escurecido e Jacira levantou-se
dizendo:
- Já é
noite! Acho que estamos abusando de sua paciência. O senhor é um homem ocupado.
- Eu
reservei todo tempo de hoje ao nosso encontro. Vamos voltar para casa e vocês
jantam conosco.
Elas
protestaram, mas Ester insistiu e, apesar de acanhadas, elas ficaram. No
momento de se despedir, Renato disse:
- Eu gostaria de conhecer o
ateliê de vocês. Ester adora ir lá.
- Teremos muito gosto em recebê-lo, doutor. Elas se
despediram e Renato mandou o motorista
levá-las
em casa. Primeiro ele deixou Margarida, depois foi levar Jacira. Ela disse que
não precisava, mas ele insistiu. Era uma ordem do patrão e ele tinha de obedecer.
Passava
das nove quando Jacira desceu do carro diante de sua casa. Ela observou que uma
vizinha saiu na porta para olhar. Mas não se incomodou, disse um boa-noite e
entrou.
Geni a tinha visto chegar e esperava nervosa:
- O
que você anda fazendo até uma hora dessas? De quem é esse carro que a trouxe?
- É de
uma das nossas clientes. Ela mandou o motorista me trazer.
- Que
luxo! A troco de quê?
- De
gentileza, mãe. As pessoas de classe são gentis e amáveis.
- O
que os outros vão pensar vendo você chegar uma hora dessas em um carro de luxo?
- Não
tenho tempo para me incomodar com a maldade dos outros. Seria muito bom se você
também não se preocupasse.
Jacira
estava emocionada pelo encontro, pela possibilidade de aumentar seu negócio e
ansiosa para contar tudo aos pais. Mas olhando o ar crítico de Geni achou melhor ficar calada.
Ela certamente faria objeções, encontraria dificuldades.
- Deixei
comida no forno, mas lave sua louça. Trabalhei o dia inteiro, estou exausta e
hoje não quero lavar mais nada.
- Não
se preocupe. Eu já jantei.
Ela
subiu para o quarto e Geni foi
atrás:
- Esse
carro não parece ser de uma cliente. Não creio que vocês tenham clientes desse
nível. Por que não fala a verdade? Arranjou outro namorado?
Jacira
parou na porta do quarto, olhou-a séria e respondeu:
- Acredite
no que quiser. Não direi mais nada. Eu também estou cansada. Boa noite.
Entrou
rapidamente no quarto e fechou a porta, não dando tempo para que sua mãe
dissesse algo. Respirou fundo tentando conter a irritação. Precisava conservar
a calma para analisar a proposta de Renato.
Tomou
um banho procurando refazer as energias, depois se estendeu na cama, pensando
no que fazer. Reconhecia que era uma oportunidade excelente. Mas antes de dar
esse passo, precisaria melhorar seus conhecimentos na área administrativa.
Desde
que deixara a oficina e se juntara a Margarida, ela sentia a necessidade de
aprender mais sobre como cuidar melhor da parte financeira.
Margarida
não gostava dessa parte, não tinha facilidade de fazer contas e deixava tudo sob
a responsabilidade de Jacira. Ela agia com cuidado, procurando fazer o melhor,
mas quando tinha alguma dúvida, não sabia como se informar.
Pensando
na proposta que receberam, ela achava que ainda não estavam preparadas para
crescer tanto. Depois de muito pensar, decidiu não aceitar a proposta de
Renato, mas procurar algum curso onde pudesse melhorar seus conhecimentos e
sentir-se mais segura para dar esse passo.
Por
sua mente passavam muitas ideias,
planos e indagações. Custou a adormecer.
No
dia seguinte, quando chegou à casa de Margarida encontrou-a também preocupada
com a proposta que tinham recebido.
- Quase
não dormi esta noite - disse Margarida -, aquela casa deu voltas em minha
cabeça. Fiquei imaginando como faria o ateliê, a sala onde as freguesas seriam
recebidas, o lugar das provas, a oficina de costura! Desde ontem não consigo
pensar em outra coisa.
- Eu
também.
- Tive
algumas ideias muito
boas. Você reparou que no andar superior há três suítes e que se nós duas
mudássemos para lá, eu ficaria em uma, você em outra e Marinho na menor. Há
ainda duas salas, você ficaria com uma, eu com outra. Iríamos morar com muito
conforto e ainda teríamos espaço no térreo para um ateliê completo e muito
chique.
- Sonhar
é bom, mas ainda é cedo para darmos esse passo. Não temos estrutura nem
dinheiro. Depois, eu não posso deixar minha família.
Margarida
suspirou, pensou um pouco, depois disse:
- Eu
pensei tudo isso, mas sei que não temos como "aceitar" essa oferta.
Ester disse que temos tempo para pensar no assunto. Mas você está certa. Não
quero meter os pés pelas mãos e de novo ficar cheia de dívidas.
- Ainda
bem que você entende. Mas isso não quer dizer que estamos desistindo. Estou
pensando em arranjar tempo para fazer um curso prático de administração,
enquanto isso vamos economizar o quanto pudermos. Quando estivermos em
condições, se essa casa ainda estiver disponível, poderemos seguir adiante.
- Isso
vai demorar e o dr. Renato não vai deixar a casa vazia para sempre.
- Se
ela não estiver vaga, encontraremos outra. O importante é nos prepararmos bem
para fazer nosso negócio crescer de maneira segura.
- Isso mesmo. Vamos trabalhar.
Temos muito serviço para entregar.
Apesar
de terem decidido não aceitar, elas continuaram imaginando como seria se
montassem o ateliê. Margarida insistia com Jacira:
- Não
tem cabimento você ter de ir todos os dias de sua casa até o ateliê. Além de
ser longe, você perderia muito tempo. Ester tem razão. Você teria de ir morar
junto.
- Você
sabe que isso não seria possível. Não posso deixar meus pais.
- Por
quê? Eles se habituariam. Depois, não estou dizendo para você abandoná-los. Até
lá, estaríamos ganhando muito dinheiro.
Você daria mais assistência, arranjaria
uma pessoa para fazer os serviços da casa.
- É,
não custa sonhar. Seria maravilhoso. Além de o serviço render, eu não teria
mais de ficar na fila do ônibus, nem viajar em pé, espremida.
- Nossa
vida seria muito boa. Poderíamos sair, ir ao cinema, já pensou?
- É
tentador. Ainda ficaria livre das queixas de mamãe. Ela adora jogar a gente
para baixo.
Margarida
ficou calada durante alguns segundos, depois disse:
- Ela
vê a vida de uma maneira trágica, sente-se infeliz.
- É
verdade. Concordo que a nossa vida tem sido difícil. Mas, por outro lado, ela
não reage, não faz nada para melhorar. Tenta se conformar com as dificuldades,
mas por dentro fica revoltada. O problema é que ela ainda não percebeu que a
queixa, além de não ajudar em nada, ainda a deixa pior. O ambiente em nossa
casa é triste, sombrio.
- Seu
pai também é assim?
- Não.
Antes meu pai era alegre, conversador.
Eu me recordo que quando eu era criança, algumas vezes ele levava
amigos em casa, mas mamãe não gostava. Ficava de cara fechada e quando eles iam
embora ela reclamava de tudo. Do trabalho por ter de fazer um café, da despesa
porque ele gostava de servir alguma coisa mais.
Ele acabou desistindo. Quando
se aposentou, ela ficou mais queixosa e ele tornou-se mais desgostoso.
- Sua
mãe é daquelas pessoas que só vai valorizar a família que tem, quando for
tarde demais. Infelizmente é assim.
- Faz
tempo que você não visita sua família?
- Faz.
Desde que eles descobriram que eu estava esperando um filho de um homem casado.
Disseram que eu só continuaria morando com eles se abortasse. Então arrumei as
minhas coisas, deixei minha cidade e vim para São Paulo. Nunca mais estive com
eles.
- Eles
não conhecem Marinho?
- Não.
Mas, depois que vim para cá, encontrei duas pessoas da minha cidade, que frequentavam a
casa deles. Isso faz três anos.
Elas estavam aqui de passagem. Estou certa de
que ao chegarem lá, foram lhes contar tudo.
- Mas
eles nunca a procuraram?
- Nunca.
Meus pais são muito rígidos. Eu tenho uma irmã três anos mais nova e eles
disseram que com meu comportamento depravado não poderia mais conviver com ela.
- Deve
ter sido duro para você.
- Foi.
Mas já passou. Eu enfrentei as dificuldades e o amor de meu filho me tornou
forte. Não me arrependo de nada. Não tenho medo da vida. Aprendi uma profissão,
trabalho, sustento meu filho honestamente. Sei que errei, mas assumi as consequências, enfrentei
os desafios e me tornei uma pessoa forte, determinada.
- Apesar
do que você passou, é uma pessoa alegre, amável, não se revoltou.
- Não
mesmo. Eu gosto de viver e de ser dona do meu nariz.
- Talvez
algum dia você encontre alguém que a ame como merece.
- Não
sei se eu quero. Estou tão bem assim!
- Sei
o que você está dizendo. Eu queria muito ter um namorado. Tive. Mas fiquei
aliviada quando terminamos.
A conversa foi longe enquanto elas
trabalhavam trocando confidências.
Jacira não se abria com a mãe e Margarida estava separada de sua
família. Elas se apoiavam mutuamente enquanto se esforçavam para construir uma
vida melhor.
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